domingo, maio 16, 2010

Bom, decidi postar esse texto que escrevi há uns meses. Em fevereiro, pra ser mais exato. Eu acho esse texto bem expressivo e como me disseram já eu criei "vida" nele. Enfim, não tenho um motivo muito exato para postá-lo além de eu gostar desse texto. Eu podia ter postado antes, na verdade, quando ele faria mais sentido, mas de qualquer forma a finalidade do blog é colocar o que escrevo e penso.

Promessa...



Era inverno, o sol mal aparecia por entre as nuvens, o vento batia forte contra meu corpo, como se quisesse rasgar minhas roupas ou simplesmente me mandar pra longe daquele lugar. Minha vontade era maior. Não me importava com o frio, ainda que nem mesmo aquele moletom me fazia sentir aquecido. Fui andando pela rua de pedras até chegar ao mar. Sentei-me na mureta, ao lado da casa de vidro. Anos que não freqüentava aquele lugar que tanto preencheu minha infância, que guardava parte de minha puberdade, o início da adolescência. E lá estava eu novamente, mas desta vez sozinho. Sem família, sem amigos, sem amores, apenas eu e o vento e o mar que quase chegava onde eu estava, ilusoriamente seguro.
Só eu sabia por que estava ali. Arranjara uma desculpa esfarrapada para me refugiar ali enquanto todos festejavam as férias do meio do ano. Eu precisava estar ali, parte de uma promessa. Promessa que eu fui incapaz de cumprir e isso me doía, ainda que tivesse passado um bom tempo. Na verdade apenas queria me sentir mais próximo dele... Não era o mesmo lugar, nem sequer era parecido. A areia era mais escura, mais espessa, nem a água era tão clara. Ainda assim não hesitei, tirei meu tênis, a meia, desci da mureta e comecei a caminhar naquela areia, sem rumo.
Não era a primeira vez que me refugiava assim apenas para me sentir próximo. Incansáveis vezes me vi desviando de meu destino para admirar um quadro numa loja, numa casa, num escritório. Por incontáveis vezes, me vi preso numa exposição de artes, olhando distraidamente para aqueles quadros que, para mim, só significavam uma coisa... aquele que um dia eu deixei.
Me lembrava de como me fez ver a arte com outros olhos, de como mudou minha vida com seu jeito sutil, mas ao mesmo tempo imperativo. Ele tinha tudo o que desejava e eu não me importava, gostava de ceder, apenas para agradá-lo. Foram muitos os breves momentos... eu sempre retornava, por ele, por mim, para ele. Um dia eu não retornei. E a cada dia, semana, mês, mais difícil se tornava retornar. Já não me recordo mais porque o deixei sem notícias, sem meus retornos, sem minha presença.
Agora esse sentimento me consumia. Parei no meio do nada, nem sinal de pessoas ou qualquer vida que fosse. Minhas reflexões e lembranças me fizeram perder a noção de tempo e espaço e lá estava eu, em frente àquele mar que não era o nosso, pisando naquela areia que não nos era familiar. Eu enganava a mim mesmo. Ele estava mais perto de mim, mas eu não estava perto dele. O quanto isso devia doer nele?
Me aproximei da água, molhando meus pés. Abaixei-me, molhei minhas mãos, pedi licença como ele havia me ensinado. Era tão natural como certas coisas me traziam de volta àquele tempo, era simplesmente surreal demais pensar que tudo aquilo se fora...
Deitei-me na areia, os braços apoiando a cabeça, de forma displicente, olhando para o céu nublado. Chuva. Não demoraria a cair, mas eu não tinha forças ou vontade de sair dali. Engraçado, chuva também me lembrava ele.
Gotas grossas caíam em meu rosto e em meu corpo e tudo que fiz foi fechar meus olhos. Lembrava de seus toques, ora intensos, ora tão suaves que me fazia arrepiar até a nuca. Senti seu cheiro se aproximar, o calor do seu corpo repousando ao lado do meu e o cheiro de sua pele mais forte, o mesmo que me enlouquecia. Abri meus olhos, ele não estava lá, mas seu cheiro não se extinguira. Meu corpo já tremia de frio, molhado, mas eu estava certo de apenas uma coisa... precisava dele.
Retornei à casa, dei apenas um aviso “não me esperem”. Peguei a chave do carro, dei partida e fui. Não me importava muito com limites de velocidade. Há coisas que não podemos esperar. Essa era uma delas. Estava distante e precisava chegar logo. Anoiteceu e eu permanecia na estrada, a paisagem passava despercebida ao meu redor, apenas via meu destino.
Próximo já de meu destino, retirei o celular do bolso. Seu número ainda constava ali. Liguei. Dois toques e nada. Três. Quatro e então meu coração parou com seu “alô”. Meu corpo estremeceu. Eu apenas disse “estou voltando...”. Houve silêncio e um soluço, não sei se de mágoa ou alívio, mas de alguma forma houve um sorriso.
Sentia meu peito apertar, o ar me faltava em demasia e de repente, o que foi um soluço dele agora era meu, ainda com o celular em minha mão, enquanto dirigia, não conseguia pensar em mais nada, a não ser no que tinha causado. Foi inevitável e não sei quando aconteceu, mas as lágrimas escorriam sem qualquer vergonha, ele me dizia que fazia bem. Meu rosto já estava vermelho e meu peito arfava em busca de ar, de alívio. Tocava “Walking After You” no rádio e eu prestava atenção em cada frase... “if you walk out on me, I’m walking after you / se você andar para longe de mim, eu estarei andando atrás de você”
Minha visão estava embaçada, via apenas a estrada a minha frente, levemente borrada, a encosta de um lado, do outro um monte verde e suas árvores. Pisquei por um segundo ou mais, tudo que me lembro são sons, buzinas, vidros quebrando, algum grito e o metal amassando, meu corpo quente e úmido.
Ali estava eu, a luz branca sobre meu corpo inerte, uma mão sobre a minha e sua cabeça repousada ao lado, os olhos inchados Sim, era ele. Me aproximei e sentei-me na borda da cama. Ele sabia que eu estava ali e levantou a cabeça. Estava tão lindo quanto eu lembrava que era. Toquei sua mão e ele se arrepiou. Aproximei-me um pouco mais e sussurrei “voltei para você”. Ele esboçou um sorriso, mas ele sabia que mais uma vez eu precisava ir e fui, não sem antes poder vê-lo se debruçar sobre meu corpo, soluçando, o quarto se enchendo de pessoas, todas de branco. Tudo estava ficando distante, mas eu me sentia leve, havia cumprido minha promessa...

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