terça-feira, setembro 07, 2010

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Houve um tempo em que achei que havia algo de errado comigo. Era algo que eu não controlava, mas ainda assim eu me sentia culpado e sujo. Impuro. Toda vez que eu pensava num garoto, logo depois vinha aquele sentimento ruim, como se algo estivesse errado, como se aquilo fosse errado. Não sei se posso culpar minha criação, já que nunca fomos católicos praticantes nem nada parecido, mas essa questão sempre esteve presente em minha vida.

Lembro-me da primeira vez que toquei um garoto e deixei-me ser tocado. O momento foi eletrizante, novo, bom e arriscado. No momento seguinte a sua partida, minha alma se partiu e eu me ajoelhava, chorava olhando para o céu e pedia perdão. Perdão por ser o que eu era, por ter sucumbido ao que todos chamam de pecado. Aquela foi a primeira vez, mas não a última que me martirizei por isso. Lembro-me, nos momentos de maior angústia, de apertar meu próprio corpo com os braços como se pudesse extrair de mim todo esse sentimento, essas impulsões que me levavam à perdição e ao que eu não entendia.

Depois de um tempo, sempre escondido, eu lia livros da minha mãe na tentativa de achar uma explicação, uma saída. Todos os que tinham em seus títulos “sexo”, “adolescentes” e qualquer outro nesse sentido, eu buscava ali uma forma de entender o que se passava comigo. Confesso que não foi totalmente inútil, mas meu maior problema não era conhecer e sim aceitar.

Isso demorou um bocado, já que nessa época eu tinha por volta dos 12 anos. Infelizmente, a vida não me reservou momentos muito fáceis nesse trajeto e eu, que já estava perdido em minhas próprias dúvidas, me vi sozinho e sem saída. Aos 16 anos, por mais que eu achasse ter me encontrado, no fundo o velho problema persistia. Eu não mais suplicava por perdão por não poder controlar meus impulsos e pensamentos, mas isso não significava que aceitasse aquela situação. Foi nesse momento que minha única válvula de escape pareceu ser a morte. Naquele momento era sofrimento demais para que eu pudesse controlar ou entender, tudo parecia contribuir para que eu não fosse mais além. Não queria mais sentir aquilo e eu me sentia sozinho no mundo. Tinha medo. Eu, que sempre fui doce, educado, esperto, o pequeno grande exemplo, estava perdido, me sentia errado, sozinho e não-aceito.

A decisão não foi difícil, mas o resultado disso me rendeu anos de sofrimento ainda maior. Eu era incompreendido e não podia admitir, principalmente a mim mesmo, o real motivo de tudo aquilo.

Hoje eu sei que eu mesmo poderia ter facilitado minha vida, mas eu era muito novo e inocente, pouco confiante e inexperiente. Ainda hoje eu tenho algumas dificuldades em me aceitar. É difícil me fazer andar de mãos dadas com um garoto ou cumprimentá-lo com um beijo num meio não-gay. Eu mesmo criei essa barreira e tenho tentado mudar isso. Dei-me conta do quanto isso é ruim não só para mim como para aqueles que eu amo quando, semanas atrás, um garoto dos mais dóceis e espontâneos foi se despedir de mim na frente da faculdade, olhando nos meus olhos e esperando, como em nossos cumprimentos, que eu o beijasse no rosto e eu, mecanicamente, a me ver rodeado de pessoas, possivelmente héteros em sua maioria, o estendi minha mão. Não me sai da cabeça o olhar de decepção dele, não sei o que passou pela sua cabeça naquele momento, mas no instante seguinte seu que ecoava na minha “idiota”... Até quando serei assim? Até quando me privarei de ser eu mesmo e aos outros de poderem se aproximar de mim sem que eu me esconda atrás de uma barreira e me feche como uma ostra?

São 22:22 (alguém está pensando em mim) e eu ainda não sei como mudar isso. Não é fácil já que desde sempre eu me puni e me policiei para evitar certas atitudes a fim de manter uma mínima imagem de garoto convencional. Afinal, eu preciso ser como a maioria? Preciso me portar de certa forma, pensar de certo jeito e evitar tudo que eu sou apenas para não ser taxado de diferente? E essa não é uma diferença qualquer, não é como se eu não tivesse cabelo ou tivesse alguma deficiência, isso vai além de tudo isso ou talvez seja mais simples. Ainda não descobri como é, como funciona, mas eu aprendi que às vezes eu preciso deixar de lado tudo isso e apenas viver como eu gostaria.

As últimas semanas têm sido mais suaves, eu tenho sido menos duro comigo mesmo. Tenho me permitido mais, tenho ficado mais o garoto que possivelmente decepcionei. Tenho me importado menos com o que estejam pensando por eu andar com ele ou se estão olhando quando estamos juntos e ele beija meu rosto ou acaricia meu cabelo. Para alguns isso pode ser algo tão banal, mas para mim isso significa muito, é como se pela primeira vez eu conseguisse alcançar um grau de satisfação pessoal e de liberdade que me foi privado durante tantos anos de minha vida.

Creio que toda essa reflexão tirou-me um grande peso das costas. Foi difícil admitir certas coisas, mas eu estou disposto a fazer certo agora. Sinto, talvez numa das poucas vezes, que está é uma boa escolha. Afinal, o que teria de errado em ser eu mesmo?

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